Tartare atentado

Tartare de salmão

Sabadão, quase oito da noite, hora da decisão:
– Fazer o jantar ou pedir pizza, hambúrguer, yakisoba.

Sim,  porque fora das grandes cidades não dá para pensar em sair às onze da noite pensando em comer … qualquer coisa que não seja hambúrguer ou cachorro quente. Isso que aqui no velho oeste já melhorou muito.

Ninguém tinha fome, desejo ou motivação. E começou a pesar aquele clima de “depois a gente vê o que faz”, que acaba sendo um “comer qualquer coisa que tiver pra enganar o estômago”.

Encostei num canto para fuçar o celular e me deparei com uma receita de tartare de salmão.

Tartare ou tartar? Uns dizem que só pode receber esse nome se levar ovo cru na receita, outros dizem que o que importa é o prato ser servido enformado com ingredientes crus.

A unanimidade é que o prato é simples, sofisticado, saboroso e leve. E eu nunca provei.

Tenho uma posta de salmão congelado. Lembrei que amanhã é domingo e tem escolinha do professor Raimundo. Então pensei: – “Porque usá-lo,  porque não usá-lo? Usei-o-o”.

E daí foi uma mistureba.

Era mostarda Dijon, mas eu só tinha uma mineira temperada.
Cebola roxa e eu só tinha branca.
Finalizar com dill. Eu nunca encontrei endro para comprar? Então vai salsinha mesmo.
Limão siciliano? Para! O Taiti é logo ali.

Estava determinado. Fui juntando as dicas de outras receitas e segui em frente.

Preparei o molho com mostarda, azeite, suco de limão, pimenta e sal.

Acrescentei o salmão, cebola, salsa, tomate cereja e alcaparras  devidamente picados e misturei tudo.

Enformei e servi com torradas feitas de última hora.

Olha, devo confessar que ficou bom.

Mas é preciso o mínimo de bom senso e humildade para reconhecer que podia ficar muuuuuito melhor.

A Dijon é mais suave do que a que eu usei. De modo que o sabor de mostarda estava muito acentuado.

E minha freguesia reclamou que eu devia ter picado ainda mais o salmão.

Mas a experiência do aprendizado compensou e me fez acreditar que vale a pena fazer de novo!

E o melhor é que eu não fiquei com a sensação de comer “qualquer coisa que tinha por aí”.

Escondidinho, bem escondidinho …

20171016_220445

Eu queria…

Juro, do fundo do coração, eu queria.

Ser daqueles que saem do trabalho pensando: – Eu quero ir pra academia e comer granola, eu quero ir pra academia e comer granola.

Mas o Tico fala pro Teco: – Eu quero tomar cerveja. E o Teco responde: – Comendo pastel.

Então, qual Ulisses superando sua jornada; qual Hércules cumprindo seus doze trabalhos, visto meu tênis e vou para a academia.

Milhares, milhões, incontáveis supinos, tríceps e agachamentos depois, me encontro prostrado e faminto.

Evito pensar que meu abdômen se tornou a morada de Cérbero e que meus míseros músculos estão sendo devorados pelas cabeças de Hidra.

Ansioso por aplacar a ira dos deuses, me entrego a mais um trabalho: trazer à luz um escondidinho de carne moída com batatas, último recurso que a geladeira reserva a este pobre mortal.

Minha amada rainha, antecipando minha agonia, cozinhou as batatas e descongelou a carne.

Munido de ungidas armas, piquei o alho a cebola e o bacon que, oprimidos pelo fogo redentor, serviram de base para que a carne moída alcançasse seu esplendor.

As batatas, esmagadas pela força deste semideus, foram ungidas por fartas colheres de requeijão e temperadas com pimenta e noz-moscada.

Em camadas, depositei o fruto de árduo trabalho: purê de batatas, fatias de queijo, carne temperada, mais purê e uma generosa dose de parmesão.

Em último sacrifício, aguardei que gratinassem em forno brando enquanto recuperava o fôlego de exasperado esforço sorvendo com sofreguidão o néctar dos deuses que os pobres mortais ousam chamar de “cerveja gelada”.

Posta a iguaria bem servida, pôde este pobre mortal, sentado no trono ao lado de sua amada rainha, recuperar suas forças para ousar, quem sabe, de novo enfrentar de novo o desafio: – ir amanhã à academia.

Caldinho de moqueca

Caldinho de moqueca

Fazendo jus ao melhor espírito restô, eu não poderia admitir que uma generosa porção de moqueca de cação com camarões fosse desperdiçada.

E como não mais me apetecia prová-la à moda original “resta” a reciclagem, que nesse caso, é muito sutil.

Reservei uma pequena porção da moqueca.

Levei ao liquidificador a maior parte e acrescentei:

  • o dobro do volume de água;
  • uma dose de cachaça,
  • uma porção pequena de cheiro verde,
  • uma pitada de sal (lembrando que a moqueca já estava temperada).

Levei a mistura ao fogo brando, acrescentei a parte reservada da moqueca e, mexendo sempre para não grudar, deixei ferver por alguns minutos. Tempo suficiente para esquentar e evaporar o álcool da cachaça.

Servi com cheiro verde e pimenta dedo de moça picadinhos acompanhado de fatias de pão.

E como adoro pimenta, não recusei ainda algumas gotas de tabasco.

Simples, fácil, gostoso e aconchegante para essas noites de primavera que insistem em não esquentar.

Não sobrou, é claro, mas enquanto me desfazia das últimas colheres imaginei que cozinhando com farinha de mandioca branca, esse caldinho ainda rendia um pirão.

Moqueca de peixe

Moqueca de peixe

Eu considero a TV Pirata, programa de humor que foi ao ar na Rede Globo entre 1988 e 1980, um dos melhores programas do gênero que já foram exibidos.

Algumas piadas, esquetes (do inglês sketch), estão tão impregnadas em minha memória que qualquer coisa é capaz de evocá-las.

Uma delas é a C.M.A.

Nunca mais vou comer moqueca de peixe sem me lembrar da interpretação do ator Luiz Fernando Guimarães travestido de baiano.

Mas eu me rendo, desisto. Não consigo ficar um ANO sem comer moqueca, (porque um dia também é demais).

Lá em casa todo mundo gosta, mas só eu sou candidato ao C.M.A.

Se aviso que vou fazer, todo mundo encontra uma desculpa para adiar.

Então, vou comprando tudo devagarinho, pimentões aqui, azeite de dendê dali, leite de coco acolá.

Ninguém percebe que estou alimentando esse “vício”.

Finalmente dou o bote, compro o peixe e o coentro e quando veem já estou preparando.

E é tão fácil que dá até preguiça de explicar.

Faço duas camadas na seguinte ordem:

  • cebolas em rodelas;
  • peixe (usei filé de cação, mas você pode mudar);
  • tomate em rodelas;
  • pimentão vermelho e amarelo em rodelas.

Depois, cubro com camarões, cheiro verde e coentro picados.

À parte, dissolvi um sachet (ou tablete) de caldo de legumes em 200 ml de leite de coco. Acrescentei sal e pimenta e derramei sobre as camadas.

Levei ao fogo baixo e deixei levantar fervura. E produz bastante caldo.

Depois de meia hora acrescentnei duas colheres de azeite de dendê.

Ali ficou, cozinhando pouco mais de uma hora até que o caldo fosse reduzido à metade.

Pronto. Servido com arroz branco e uma cachaçinha envelhecida.

Moqueca na panela

Não adianta, ainda vai levar um bom tempo para eu me juntar ao C.M.A.

Quer entender do que estou falando ? Quem sabe você ainda consegue seguir o link: http://youtu.be/LKoe01Yi5pk

Pão italiano recheado

Pão Italiano

Em um incerto fim de tarde, estava eu tranquilo quando toca o telefone.

Elétrico, como sempre que tomado de euforia, Beto falava: – “Vem cá no muro”.

Vizinho, compadre e amigo a gente não questiona, obedece.

E vinha ele com mais uma criação culinária construída sobre o tripé do sucesso: disponibilidade x necessidade x fome.

Aprendi com ele a transformar um pão italiano num requisitado prato divertido e saboroso.

Quando ele o fez pela primeira vez, a linguiça sobressaltava de tal modo que nos era impossível lembrar se havia outra coisa naquela receita.

Mas o tempo foi seguindo, a receita se repetindo, e novos elementos surgindo foram construindo variações que hoje alcançam um novo padrão de excelência.

E seja ela como for, sempre fazendo jus ao meu amigo criador.

Um pão de tamanho que baste serve de recipiente para o recheio.

Esse pode ser do que houver ou lhe aprouver.

Nesse caso, uma linguiça blumenau ou colonial de porco, desfiada e um maço de escarola se combinam.

Douro um pouco de cebola e alho no bacon e acrescento a linguiça.

Refogo rapidamente, acrescento uma dose de aguardente e flambo.

Assim que o fogo acaba, incorporo a escarola cortada em tiras e garanto que toda ela refogue, sem passar do ponto.

O interior do pão italiano, já sem a coroa e o miolo, forro com fatias de mussarela.

Usando um pegador de macarrão ou de salada, vou preenchendo o pão com o recheio de linguiça com escarola. O interessante é descartar o excesso de líquido pois isso deixaria o pão encharcado.

Quando completo, acrescento mais um pouco de mussarela e fecho o pão com sua coroa vedando com parmesão ralado.

Levo o pão ao forno pré aquecido por vinte minutos e está pronto.

Beto Belini, meu compadre vizinho, que provou e elogiou esta receita adaptada, nunca reivindicou a autoria. Nunca se arrogou ser o autor desta ou de outra criação. Esse é seu espírito gentil, caridoso, amigo e fraterno.

Ele e eu sabemos que em maior ou menor grau, todos nós já chegamos ao ponto em que nada se cria, tudo (em algum grau) se copia. E isso já dizia Chacrinha.

Essa receita, é apenas uma que aprendemos juntos a fazer e degustar em família.

Outras tantas apenas provei pensando que sempre haveria tempo de aprender.

Não há. O tempo é agora. O amanhã não existe.

Então faço agora com prazer, para saciar a fome e a saudade do bom amigo que doravante só pode provar a alegria.

Provo, com um fio de azeite e uma taça de vinho branco.

Udon

Udon

O friozinho não é muito mas já se faz presente.

Então chega sexta-feira, eu e minha amada sozinhos, falta vontade de fazer muita coisa e sobra vontade de comer algo especial, de preferência quente.

Antes do cair da noite visito o mercado antecipando as compras da semana e vou ponderando como fazer de uma noite comum um momento especial.

Pensando em um yakisoba padrão para o almoço de sábado, me vejo caminhando pelos corredores e lembrando do tempo em que morávamos em Cuiabá e saíamos rumo a Várzea Grande onde em algumas noites se organizavam feiras livres. Numa delas conhecemos um idoso casal de japoneses que serviam um inesquecível Udon.

Casais japoneses são herméticos, você é incapaz de dizer o que habita sob aquela superfície de polidez. Mas aqueles dois sempre me inspiraram um carinho e cumplicidade que se materializava naquele singelo prato da culinária nipônica.

Provei várias versões ao longo dos anos, mas nunca esqueci aquele que nos acompanhava em nossos primeiros momentos de felicidade conjugal.

E hoje, quase vinte e cinco anos depois, tomei coragem e enfrentei o desafio (insipiente bem sei) de preparar um Udon para dois.

Todos os ingredientes a postos, comecei colocando uma panela com um litro de água no fogo. Quando levantou fervura, desliguei e coloquei duas folhas picadas de nori (aquela alga que se usa para fazer sushi). Deixei alguns minutos, retirei as folhas e reservei.

Acrescentei ao caldo um saquinho de Hondashi, quatro colheres de shoyo e outras tantas de saquê. Para acrescentar um toque pessoal, inclui um preparado instantâneo de missoshiro (você compra todos os ingredientes por esses nomes nas melhores lojas do ramo). Sei que não é a receita original, mas na falta de coisa mais apropriada a gente tem que improvisar. Afinal, o mais importante é um caldo quente com toque oriental para uma fria noite de outono ocidental.

Em paralelo, coloquei dois litros de água em outra panela para ferver o macarrão. Na falta de macarrão próprio para Udon, usei o macarrão “Assai Somen” que é mais fino e exige mais cuidado para não desandar.

Enquanto a água esquentava preparei o omelete. Usei quatro ovos, mas bati um de cada vez temperado com uma pitada de sal, aji e açúcar. Fritei individualmente para obter folhas finas de omelete, como se fossem panquecas.

Quando a água ferveu coloquei o macarrão, apenas 250 gramas. Mexi bem e deixei cozinhar por três minutos. Foi o tempo suficiente para cortar as quatro “panquecas” de ovo em pequenas tiras.

O macarrão foi escorrido e lavado em água fria. Reservei.

Lavei um maço de cebolinha e piquei.

Quando o caldo (dashi, com alguma liberdade) ferveu foi só chamar minha companheira para jantar.

Brilhantemente ela lascou pequenas tiras de gengibre para colocar no fundo da tigela que foi coberta com macarrão, as folhas hidratadas de alga (nori), o caldo (dashi), omelete e cebolinhas.

Não ficou melhor que o que fazem nossos amigos Cláudio e Regina. Tampouco fez jus ao dedicado trabalho daquele amável casal que provavelmente já habita o andar superior dessa existência.

Mas nos aqueceu, foi um jantar diferente que fez lembrar que coisas boas são feitas com amor, carinho e dedicação. São coisas simples que possuem valor inestimável, como a lembrança daquele idoso casal que parecia não precisar daquele trabalho para viver, mas escolheu viver daquele trabalho para tocar a vida de pessoas como nós.

De modo singelo, deixaram uma inesquecível mensagem de amor depositada em cada tigela de macarrão que serviram.

Que o cara lá de cima dê uma abraço caloroso a eles por nós.

Os números de 2012

Os duendes de estatísticas do WordPress.com prepararam um relatório para o ano de 2012 deste blog.

Aqui está um resumo:

4,329 films were submitted to the 2012 Cannes Film Festival. This blog had 31.000 views in 2012. If each view were a film, this blog would power 7 Film Festivals

Clique aqui para ver o relatório completo

Cheese salada

Cheese Salada

 

A foto é linda, uma perfeição delicadamente equilibrada para aguçar os sentidos. Sua boca saliva e sua estômago começa a roncar.

Vontade de comer um hambúrguer macio e suculento.

Cedo ou tarde você passa por isso.

Seja na TV, internet, outdoors ou em cartazes de lanchonetes espalhadas por este país, você vai ver a foto do sanduíche perfeito e irresistível.

Então você pede e vem aquela coisa disforme, engordurada, cinza e sem sabor.

Nestas horas você se identifica com William Foster, personagem de Michael Douglas no filme “Um dia de Fúria” e fica com vontade de jogar tudo para o alto.

Talvez por isso uma certa cadeia de fast-food especializada em hambúrgueres utilize um palhaço como garoto propaganda. É para evitar que você perceba que o palhaço é você.

Há exceções é claro.

Os hambúrgueres do restaurante Madero do chef Junior Durski, em Curitiba e além, escondem um rico sabor por trás de uma apresentação simples.

Com opções variadas, o Cadilac em Cascavel também agrada a paladares mais exigentes.

Ambos são confeccionados com hambúrgueres encorpados e grelhados em carvão em brasa. Isso, por si, já faz uma diferença enorme.

Mas a maioria das opções que se encontram são flagrantemente sofríveis e pouco saudáveis.

Por isso, depois de tanta frustração resolvi fazer meus próprios hambúrgueres. Pelo menos assim não me sinto enganado.

Com 300 gramas de carne moída de primeira (com pouca gordura) consigo preparar três porções generosas.

Em uma tigela coloco uma cebola pequena, uma colher de sopa de bacon e cheiro verde, tudo bem picadinho.

Adiciono a carne moída e um pacote de creme de cebola.

Misturo tudo e reservo na geladeira por vinte minutos.

Enquanto isso preparo os demais ingredientes: salada, molhos, queijos e o que mais a imaginação desejar colocar entre as metades de um pão macio.

Levo a grelha de ferro fundido que direto ao fogão e deixo aquecer em fogo baixo. Já preparei em churrasqueira usando carvão e fica excepcional, mas demora.

Separo a carne em três partes, modelo o hambúrguer com as mãos e vou colocando na grelha untada.

Deixo dourar de um lado e viro.

É a hora para quem gosta do queijo fundido ou do presunto aquecido acrescentar as fatias sobre o hambúrguer Também é a hora de fritar fatias de bacon.

Dessa vez optei por um simples cheese salada.

Aliás é interessante como a criatividade do povo brasileiro incorporou o hambúrguer

Por aí se vê X-isso, X-aquilo, X-tudo. Já ouvi a seguinte explanação de um atendente de lanchonete: – ” No X-bacon, O x é a incógnita que admite a inclusão de qualquer ingrediente para acompanhar a constante que no caso é o bacon.” – PERFEITO ! Nem Einstein explicaria tão bem.

Mas voltando à minha fome, monto meu lanche com uma fina camada de maionese, queijo mussarela, o hambúrguer, tomate, alface e finalizo com um fio de mostarda.

Sanduíche honesto e sem enganação,
que eu não sou palhaço não !

Boeuf Bourguignon

Boeuf Bourguignon

Se fosse descrever o universo, diria que ele se parece com uma espiral crescente de círculos concêntricos que se interpõem sucessivamente.

Ficou difícil entender ? Talvez seja mais fácil dizer que nesta vida nada acontece por acaso.

No post anterior falei de um curso de culinária organizado pelo Senac do qual participei (esta semana está acontecendo outro, mas o frio me impediu de participar).

Foi lá que aprendi a receita do maravilhoso  prato que dá nome a este post.

Nome francês que exige biquinho até para ser mediocremente pronunciado. Dá até gosto ver minha filha falar (boooffff burguinhonnn). Ela sabe falar, eu patino.

Saborosa combinação de sabores. A textura da carne, o caudulento sabor dos ingredientes, a cremosidade do molho. Tudo isso me encantou na primeira garfada.

Se o curso se resumisse a essa ancestral receita, ainda assim teria sido barato. Mas nossa Chef Master Fabiana, não se contendo, passou singelas e preciosas dicas para o corte da carne, seu preparo e conservação durante o aprimoramento do molho.

Tudo tão simples. Tão óbvio depois que se aprende que é de se perguntar: onde ela estava que não me convidou para jantar ?

Travadas de língua à parte, municiei-me de uma gin-tônica e fui pesquisar a história do boooffff.

Estava lá na wikipédia, prato tradicional da região de borgonha, leste da frança. Provavelmente resultando da qualidade inferior das carnes consumidas pelos camponeses (a necessidade é a mãe de todas as invenções), blá-blá-blá…

Até que encontro na última frase uma citação em que Julia Child descreve o prato, sauté de boeuf à la Bourguignonne , como “certamente uma dos mais deliciosos pratos de carne inventado pelo homem. ”

Fico sem saber o que é que o sauté significa na frase, mas sei que Julia Child é para os americanos o que Ofélia é para os brasileiros. REFERÊNCIA !

Foi depois de assistir ao filme Julie & Julia que tomei a decisão de criar o projeto Restô d’Ontê. Eu já pensava em fazê-lo desde os saudosos tempos de Larica Total, mas ainda não tinha recebido aquele pontapé na bunda que nos faz avançar.

Então chego à explicação do primeiro parágrafo. O universo conspira contra nós.

A melhor receita apresentada no curso que acabei de fazer para sanar minha insegurança culinária é justamente aquela que mais agradava àquela personagem que me serviu de inspiração para o que faço aqui.

E foi assim. Simples assim.

Escalopes de filé mignon grelhados em chapa de ferro fundido, reservados em travessa protegida por papel alumínio levada ao forno morno e pré aquecido. Dicas que aprendi no curso, garantem a textura, maciez e temperatura da carne até que se complete o preparo do molho.

Numa frigideira grande coloco cubos de bacon para fritar em manteiga. Quando alcançam a aparência adequada acrescento alho e cebola picados e refogo.

Acrescento uma taça de vinho tinto e um toque de vinho do porto (este por minha conta) e espero começar a ferver.

Na falta do demi glacê, incorporo 800 ml de caldo de carne e acrescento uma colher de sopa de farinha de trigo para engrossar o caldo.

Misturo tudo e vou acrescentando cenoura e vagem picados, cebolinhas em conserva  e champignon em metades.

Quando este molho alcança uma boa textura, salpico cheiro verde picado. Retiro a carne do forno, despejo o suco que ela soltou no molho, misturo bem e devolvo à travessa.

Sirvo acompanhado de espaguete refogado em manteiga.

Julia se revira no túmulo a cada vez que reviro a língua e pronuncio Huuuuuummmmmm!!!

Ela sabe o quanto a receita é incompleta, mas também sabe o quanto está maravilhosa.

Minhas desculpas…

Chef Fabiana Barão e eu

Quem acompanha este blog merece meu sincero pedido de desculpas.

Fiquei um tempo ausente e isso não se faz.

Mas explico.

Desde o dia em que preparei o primeiro omelete com salsicha viana em lata até a recente farofa de mignon de suíno com frutas, já se vai mais de um quarto de século.

Muitos erros, alguns acertos e deliciosos momentos de satisfação culinária entre amados e amigos.

Quando comecei este blog foi nutrindo alguns desejos complementares: a compulsão de escrever, a necessidade de fotografar e o desejo de compartilhar experiências.

E tudo correu bem. Até que… até…

Quando escrevemos nos expomos. É consciente mas um tanto quanto esotérico. A absoluta maioria dos mais de três mil leitores do blog nunca me escreveu e nem vai deixar seu recado. Normal.

Mas então alguém escreve: “Mas que droga é essa???? Quais são as quantidades dos ingredientes e suas proporções relativas????

Então eu fico sem ação. não devia, mas fico.

Não sou chef, cozinheiro ou gastrônomo. No máximo um alquimista fajuto que se alegra em misturar ingredientes para matar a fome e o tempo.

E isso dá um prazer danado.

Aquele que me escreveu tem razão, não há receitas aqui porque eu não as sigo. Simples assim. Eu leio, interpreto e executo. Mas não sigo.

Durante anos me defrontei com receitas que pediam kirsch. Eu nunca tinha sequer visto kirsch. Quando encontrei comprei uma garrafa e nunca me serviu de nada, nunca mais encontrei uma receita que pedisse kirsch.

Esta constatação está no cerne do Restô d’Ontê, buscar o prazer e a satisfação com o que está à mão. Sem radicalismo, preconceito ou restrição.

Inúmeros são os sites que oferecem receitas de pratos variados. De múltiplos ingredientes, bolsos e gostos variados. Consultei vários nestas muitas notes de larica.

Não me proponho a ser mais um de muitos. Se fosse um programa de televisão seria um bate papo entre amigos que preparam comida para matar a fome e não um programa culinário.

Minha proposta é estimular o leitor a fazer algo para o prazer de quem se ama. Com o melhor que se tem a oferecer: seus ingrediente, seu tempo, seu trabalho, sua atenção e seu amor.

Porque comer é necessário, mas prazer é fundamental.

E não há maior prazer que a gratidão de quem você alimenta com carinho.

Conheço bem minhas limitações, e não são poucas.

Prova disso fui encontrar num curso de culinária oferecido pelo Senac. Curso de preparo de carnes diversas.

Entre receitas que já conhecia, outras que não dominava e algumas que jamais me ocorreria preparar encontrei dicas valiosas.

Entendo que é assim que se aprende. Como disse Confúcio: “Eu ouço e esqueço, eu vejo e me lembro, eu faço e aprendo.

Depois de uma semana de convívio com pessoas agradáveis, sob o comando da chef Barão foi possível constatar a exatidão destas milenares palavras.

Com sua fala mansa, sua autoridade gentil e sua serena organização, ela ensinou muito mais do que acreditava ser possível em tão pouco tempo.

Não espere encontrar aqui receitas. Apenas poesia (medíocre) e inspiração.

E pelo espaço sou grato. Pelo respeito me sinto satisfeito.

O que me importa, enfim, é fazer o bem e ser feliz.

Se houver prazer, melhor assim.

Entradas Mais Antigas Anteriores